A Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados realizou uma audiência pública na quarta-feira (19) para discutir os desafios e as oportunidades na implementação da tarifa zero nos sistemas de transporte das cidades brasileiras. Com a participação da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), o evento abordou a sustentabilidade do benefício por meio de fontes alternativas de financiamento e a necessidade de maior participação do governo federal na pauta.

O secretário Executivo da Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos (FNP), Gilberto Perre, comentou que o sistema de transporte no Brasil partia de uma premissa de que a receita tarifária, aquela paga pelo passageiro, poderia sustentar as despesas de toda a operação. Segundo ele, esse conceito se tornou insustentável nas últimas décadas, sendo necessárias outras fontes de recursos.

Para Perre, existem diversas soluções possíveis, contudo, demandam uma pactuação política federativa. Uma delas seria a destinação de parte da CIDE Combustíveis para o custeio do transporte público. “Se União, Estados e Municípios não sentarem à mesa para construir essa pactuação, que favoreça o usuário do transporte público, não vamos sair desse dilema”, alertou. A CIDE é um tipo de tributo que incide sobre a importação e a comercialização de gasolina, GNV e álcool etílico.

Outras alternativas, segundo o representante da FNP, seriam a cobrança de estacionamento de vagas em espaços públicos e destinação de recursos provenientes da emissão e renovação da carteira nacional de habilitação. “A expansão da frota de veículos individuais motorizados congestiona as ruas, diminui a produtividade do sistema de transporte, aumenta o custo do sistema. O usuário do transporte público é penalizado pelo usuário do automóvel quando ele decide tirar o carro da garagem”, lamentou Perre.

O deputado federal Celso Russomano (Republicanos-SP), favorável à adoção da tarifa zero nos municípios brasileiros, concordou com a destinação da CIDE para contribuir com o custeio do transporte coletivo. “Nas grandes cidades, quem quer andar de carro, vai ter que pagar um pouco mais caro. Não tem saída para isso”, afirmou.

Russomano ressaltou, ainda, que, embora a tarifa zero seja necessária para o maior acesso da população ao transporte, em grandes centros urbanos, é um desafio. “Para uma cidade do tamanho de São Paulo, com uma quantidade de habitantes tão grande, o custo é muito alto para que a prefeitura possa arcar com a tarifa zero”.

Matteus de Paula Freitas, coordenador do Núcleo Técnico da NTU, apresentou o estudo temático sobre tarifa zero, divulgado em abril pela instituição, que apontou 124 municípios com o benefício à época. De acordo com o coordenador, 70% dos casos surgiram nos últimos quatro anos impulsionados principalmente pela pandemia. A maioria das cidades têm até 50 mil habitantes, o que revela a dificuldade de municípios de maior porte, como capitais, conseguirem sustentar o benefício, segundo Freitas.

“É inegável que a tarifa zero aumenta a quantidade de passageiros no sistema e aumenta a acessibilidade das pessoas, principalmente em situação de vulnerabilidade econômica e social”, afirmou o coordenador da NTU. “Acredito que todos nós queremos mais pessoas utilizando o transporte público, menos gente utilizando o transporte individual motorizado,” acrescentou. Matteus Freitas reforçou, ainda, a necessidade de fontes de financiamento alternativas para infraestrutura, governança e qualificação.

Paíque Duques Santarém, da Coalizão Mobilidade Triplo Zero e do movimento Passe Livre, defendeu que o transporte coletivo deve ser pensado a partir das necessidades dos usuários e dos trabalhadores do serviço. Ele destacou que os municípios não conseguem viabilizar e sustentar a tarifa zero sozinhos, e que precisam de recursos federais.

O ativista reforçou que o sistema de transporte público brasileiro está em crise. “O transporte vai mudar para algum rumo. Se a gente não aponta para um caminho de universalização, a gente pode estar apontando para o caminho do fim do transporte público coletivo”, afirmou Santarém.

Como parte das soluções para a sustentabilidade da tarifa zero, Rafael Calabria, coordenador do Instituto de Defesa de Consumidores (IDEC), apresentou um levantamento da instituição com dez propostas para alcançar com qualidade o subsídio pleno do transporte.

“Muitas vezes, as periferias são precarizadas no atendimento do transporte público”. Segundo ele, é essencial garantir infraestrutura adequada, como faixas exclusivas e corredores de ônibus para a universalização do serviço.

Fonte: Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos – NTU