Recente pesquisa de Orçamento Familiar (POF), divulgada pelo IBGE, concluiu que pela primeira vez na história o transporte passou a ser o segundo maior gasto das famílias brasileiras, superando a alimentação e a educação. Em primeiro lugar, vem a habitação. Esta é mais uma consequência, de tantas outras, que o lobby do transporte por aplicativos vem causando em todas as médias e grandes cidades. O transporte por aplicativo é campeão no quesito comodidade comparando com qualquer outro meio. Mas essa comodidade individualista continuará a produzir efeitos econômicos e sociais cada vez mais graves. Os motivos que levaram o transporte a encabeçar a lista do produto com o segundo maior gasto pelas famílias brasileiras é somente um. Nos últimos cinco anos, ocorreu uma migração de 30% dos passageiros do transporte coletivo para os aplicativos. Essa migração gerou dois efeitos, primeiro o transporte coletivo ficou mais caro devido à perda de produtividade, como consequência teve reajustes acima da inflação. Já os 30% que migraram de modal, pagam em média 80% mais caro, em troca da comodidade. Ou seja, tanto as pessoas que continuaram no transporte coletivo como as que se transformaram em clientes dos aplicativos, estão gastando mais em deslocamentos. Isso que os aplicativos operam com preços subsidiados, algo que não será perene, pois os custos em transporte tendem a aumentar. Mas o cerne do problema está atualmente no judiciário, que vem emitindo pareceres contra uma regulamentação efetiva em relação a este modal. Enquanto isso, os condutores de aplicativos continuam sem passar pela avaliação de um órgão regulamentar, e trabalhando 12 horas por dia. Temos ainda os governantes, que além de incentivarem o subsidio no automóvel, praticamente “deram as costas” para as práticas de dumping utilizadas pelos aplicativos. Em países como Alemanha, Itália, Turquia, Japão, Espanha, eles não existem ou operam com restrição. Esses países perceberam, há muito tempo, que os aplicativos são, na verdade, os “camelôs da mobilidade urbana”. Sendo assim, a situação fica mais grave ainda quando se conclui que 25% do arrecadado pelos aplicativos não permanece em solo verde-amarelo. Para um país que tem um déficit público de R$ 130 bilhões/ano, é no mínimo curioso permitir um aumento substancioso no custo de transporte para os brasileiros em conjunto com uma renúncia fiscal.
Antônio Augusto Lovatto – engenheiro de Transportes