Os sistemas de mobilidade urbana são grandes consumidores de energia e, consequentemente, tem grande participação na emissão de poluentes locais, que causam a degradação da qualidade do ar, e gases de efeito estufa, que causam as mudanças globais do clima. A agenda das mudanças climáticas tem sido o centro da atenção nos últimos anos, resultando em grande pressão para a eliminação de combustíveis fosseis (gasolina e óleo diesel) do transporte nas próximas décadas.
Apesar de correta a abordagem da mitigação das mudanças climáticas, que também contribui para a melhoria da qualidade do ar, a agenda ambiental não pode deixar de incluir o elevado numero de mortos e feridos que, anualmente, envergonham o Brasil, quando comparado com outros países. Afinal, a agenda ambiental tem o objetivo de preservar a vida e os ecossistemas.
Nessa abordagem, estamos tratando de padrões de mobilidade urbana que geram impactos com diferentes escalas temporais e abrangências territoriais. As mortes e os feridos no transito podem ser considerados impactos imediatos e nacionais, uma vez que ocorrem todos os dias no Brasil, afetam as famílias (impacto emocional sem mensuração) e resultam em elevados gastos no sistema de saúde e perda de capacidade produtiva do País.
A degradação da qualidade do ar e as doenças resultantes da exposição a elevadas concentrações de poluentes podem ser consideradas efeitos de médio prazo e de abrangência regional, uma vez que a dispersão de poluentes na atmosfera não segue cortes geográficos rígidos e pode afetar cidades próximas. As mudanças climáticas podem ser consideradas de longo prazo, pois as alterações ocorrem lentamente e tem escala global.
A ampliação da participação do transporte público coletivo nos sistemas de mobilidade urbana traz benefícios que atendem os três temas da agenda ambiental, além de proporcionar, adicionalmente, benefícios sociais e econômicos. Cabe lembrar que o transporte público e o único serviço dos sistemas de mobilidade urbana que pode ser universalizado em uma cidade e disponibilizado para todas as pessoas, sendo também o meio de transporte mais seguro.
Estratégias para sua expansão e eliminação de barreiras de acessibilidade física e econômica, dado o elevado nível tarifário para o usuário, são fundamentais para o País nos próximos anos, constituindo-se em uma ação essencial para o desenvolvimento das cidades. Porém, essa agenda precisa superar barreiras associadas à implementação de politicas publicas. O congelamento do orçamento federal, por meio da Emenda Constitucional n° 95/2016, impede a implantação de infraestrutura de transporte público, e os governos locais não têm capacidade de investimento. Caberá aos prefeitos implantarem as faixas exclusivas de ônibus que melhoram as condições gerais de operação e trazem benefícios para os usuários e para o meio ambiente. Isenções e reduções de impostos, mesmo em um quadro de alegada crise fiscal, têm sido direcionadas para o transporte individual, quando deveriam ser direcionados para o transporte público, para que o usuário não pague a conta da substituição da fonte de energia. Cabe lembrar que a eletrificação dos automóveis, sem a solução dos problemas de mobilidade urbana, vai criar o ecocongestionamento (Ferreira e Boareto, 2013). Somente o transporte público coletivo pode, efetivamente, proporcionar o desenvolvimento sustentável das cidades.
Renato Boareto é graduado em Gestão Ambiental com ênfase em meio ambiente urbano. Atua há mais de 20 anos no planejamento e na gestão de sistemas de transporte e mobilidade urbana. Foi diretor de Mobilidade Urbana do Ministério das Cidades e trabalhou em diversas administrações municipais. Foi coordenador da área de mobilidade urbana do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA).
Fonte: Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos – NTU