Refletindo um conflito que contraria o senso comum, foi protocolado pela entidade que representa as empresas de ônibus o pedido de revisão da tarifa. Embora soe estranho, as concessionárias não são favoráveis ao aumento da passagem. Se fosse questão de escolha, isso nem seria cogitado. Mas a questão é sobrevivência.
Aumentar a tarifa significa manter a operação ativa, viável, cobrir os custos do serviço, ainda que não resolva a crise financeira que as companhias enfrentam. Entretanto, aumentar a tarifa significa também afastar o passageiro, contribuindo para a queda recorrente no número de usuários pagantes. Somente em 2017 – comparado ao que estava previsto no edital de licitação – foram 42 milhões de usos a menos nas roletas dos coletivos. Quase 11% dos passageiros que utilizavam o serviço e pagavam por ele migraram para outros meios, entre eles, evidentemente, para os aplicativos de transporte particular.
Esses aplicativos não substituem a abrangência e a função social do modal ônibus, tampouco são boa opção em termos de mobilidade e sustentabilidade, mas concorrem quanto à agilidade e ao preço. Para manter a competitividade, o ônibus precisa ser, principalmente, barato e rápido. Duas condições que não se tem atualmente. O coletivo fica preso no congestionamento junto com os carros, amargando a falta de políticas públicas que o priorizem. Apenas 7% das vias percorridas têm corredores ou faixas exclusivas. Nos últimos anos, o diesel subiu o dobro em relação à gasolina. O resultado é o fortalecimento do círculo vicioso: a tarifa sobe, o passageiro cai, a tarifa sobe mais.
Fato é que nenhum segmento sobrevive com R$ 135 milhões de déficit em dois anos. Menos ainda consegue permanecer saudável economicamente com 35,74% de usos gratuitos, sendo que a média nacional gira em torno de 17%. Isso quer dizer que, em Porto Alegre, a cada três pessoas que sobem no ônibus, uma não paga. E o maior problema: quem paga para ela são as outras duas, que gastam 50% a mais. É como se você entrasse em um restaurante e o garçom dissesse que a refeição vai custar mais caro pra você, porque a pessoa da mesa ao lado vai comer de graça. Você pode ser autônomo, receber um salário mínimo, não ter vale-transporte. A pessoa da mesa ao lado pode ter uma condição financeira mais favorável. Ainda assim, você vai custear o almoço dela. É justo?
É justo que uma parcela pague mais para que outra tenha benefícios? Ou o justo seria dividir o custo do sistema por todos que o usufruem? Ou o justo seria, ainda, que toda a população da cidade subsidiasse o transporte coletivo através de impostos e taxação sobre produtos?
Os R$ 4,5461 que as empresas calcularam para que o serviço tenha viabilidade poderiam virar R$ 2,90. Se todos pagassem passagem, ou se houvesse outra fonte de receita para financiar as gratuidades, esse seria o valor cobrado. Por isso, não há relação direta com o percentual de inflação. O custo é dividido entre quem paga. Quanto menos pessoas para dividir a conta, maior ela fica.
O reajuste de 12% na tarifa não é a solução, mas é a saída para evitar o colapso. Se permanecer como está, o desfecho será a falência do sistema. No momento, sobreviver é o único caminho.
Gustavo Simionovschi – diretor executivo da Associação dos Transportadores de Passageiros de Porto Alegre (ATP)
Fonte: Zero Hora